Para quem investe em debêntures, CRIs e CRAs (Certificados de Recebíveis Imobiliários e do Agronegócio), o vencimento antecipado de um título quase sempre é sinônimo de problema. No mercado de capitais, o pagamento antecipado de uma dívida é comumente associado a inadimplência, descumprimento de obrigações contratuais e até pedidos de recuperação judicial. No entanto, um evento desafiou essa lógica em agosto.
A Solubio, fabricante de insumos biológicos, finalizou o vencimento antecipado de seus dois primeiros CRAs (Certificados de Recebíveis do Agronegócio) no mês passado e, ao contrário do que alguns investidores podem pensar, o movimento foi considerado um sucesso. A companhia disse que o vencimento antecipado permitiu reforçar sua posição financeira, aumentar a eficiência e diminuir gastos.
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Nesse caso, o vencimento antecipado resolveu um impasse que se arrastou por alguns meses. No ano passado, a Solubio renegociou a dívida de dois CRAs que havia emitido em 2021 e 2023. A solução envolveu a emissão de um terceiro papel, que substituiria os dois primeiros. A ideia era cancelar os primeiros CRAs, tarefa que foi inviabilizada pela obrigação de conseguiu o aval de 90% dos credores. Por fim, o vencimento antecipado dos primeiros CRAs foi a proposta aceita que permitiu a diminuição de custos da companhia.
“O vencimento antecipado não decorre apenas de eventos negativos”, garante Gustavo Rabello, sócio de mercado de capitais do SouzaOkawa Advogados. Ele é um dos especialistas em crédito privado entrevistados pelo InfoMoney para mostrar quando o vencimento antecipado é boa ou má notícia e como os investidores podem se informar sobre essa possibilidade antes de tomar a decisão de investir em um CRA, CRI (Certificado de Recebível Imobiliário) ou debênture.
Quando a notícia de vencimento antecipado é boa ou má?
Se um título da sua carteira tiver o vencimento antecipado declarado, há chances de que as notícias sejam boas. Um dos casos positivos é quando a empresa teve um ano positivo e decide usar parte do caixa gerado para o pagamento de dívidas, o que acontece quando a companhia entende que pode não conseguir retorno superior aos juros da dívida investindo o montante excedente.
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“Outra alternativa pode ser o refinanciamento proativo de uma dívida, para aproveitar, por exemplo, um cenário de queda de juros”, explica Leonardo Ugatti, sócio do Azeredo & Ugatti Advogados. Rabello diz que, “nesses casos, o pré-pagamento pode sinalizar ao mercado disciplina e solidez financeira”. Embora possível, a relação do vencimento antecipado com notícias positivas sobre o emissor é exceção, dizem os especialistas.
Uma das situações mais comuns que geram o pagamento antecipado é o descumprimento de obrigações contratuais conhecidas como covenants. “Isso inclui alteração de controle societário, atrasos no pagamento de juros ou amortizações, quebra de índices financeiros, ingresso em recuperação judicial ou mesmo situações de descumprimento de normas legais relevantes, como a legislação anticorrupção”, lista Marinis Pigossi, sócia do Cepeda Advogados.
Nesses cenários, a decisão de promover o vencimento antecipado vem dos investidores, que podem exigir o pagamento imediato do valor devido, em vez de esperar a data final de vencimento do título.
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Direitos dos investidores
Quando o vencimento antecipado de um título é decretado, os investidores devem receber o valor aplicado no título acrescido da remuneração proporcional até a data do pagamento, explica Karine Bincoletto, Head de Estruturação da Opea. Portanto, quando esse evento acontece, o investidor não recebe o valor devido quando o papel é levado até o vencimento, mas uma remuneração proporcional ao tempo em que o dinheiro ficou na aplicação.
“Este valor deve ser honrado pelo devedor ou cedente do lastro do título; e quando não honrado por estes, a obrigação recai aos garantidores e garantias”, diz Bincoletto. Neste último caso, acrescenta a especialista, a empresa que emitiu o papel fica responsável pela execução das garantias e o investidor pode precisar arcar com eventuais custos da execução.
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Gustavo Rabello ainda acrescenta que “alguns instrumentos podem prever ainda prêmios ou multas de pré-pagamento”. Para saber as regras de cada emissão, o investidor pode pesquisar pelas escrituras, no caso das debêntures, e termos de securitização, quando o objeto é um CRI ou CRA.
“Além do próprio instrumento da emissão, as ofertas destinadas ao investidor de varejo e qualificado devem contar necessariamente com prospecto, onde constam as informações completas do título e da oferta – todos os documentos da emissão são públicos e disponibilizados na CVM e na página do distribuidor”, lembra Marinis Pigossi.
A especialista ainda recomenda verificar a saúde financeira da companhia emissora, analisando as demonstrações financeiras – que geralmente são anexadas aos prospectos – e observar a qualidade das garantias da operação. “As garantias reais – como penhor de recebíveis, hipoteca ou alienação fiduciária de bens – tendem a ser mais sólidas e eficazes do que garantias meramente pessoais”, conclui.
Infomoney