A prisão da deputada federal licenciada Carla Zambelli (PL-SP) na Itália reacendeu o debate sobre a possibilidade de extradição de cidadãos italianos — especialmente à luz de um caso emblemático na história recente: o do ex-ativista Cesare Battisti.
Zambelli foi detida nesta terça-feira (29), em Roma, após semanas foragida da Justiça brasileira. Ela foi condenada a mais de dez anos de prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por crimes de falsidade ideológica e invasão de sistema eletrônico, e teve seu nome incluído na lista vermelha da Interpol.
Ao buscar refúgio na Itália, a deputada argumentou que sua cidadania europeia impediria a extradição. Mas a legislação italiana e o histórico diplomático entre os dois países mostram que a decisão sobre seu destino estará nas mãos da Justiça local — e será, acima de tudo, política. Um exemplo emblemático disso é o caso do ex-ativista italiano Cesare Battisti.

Battisti no Brasil
Cesare Battisti foi condenado à prisão perpétua na Itália por quatro assassinatos cometidos nos anos 1970, quando integrava um grupo de extrema-esquerda. Refugiado no Brasil desde 2004, teve sua extradição autorizada pelo Supremo Tribunal Federal em 2009. No entanto, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se recusou a entregá-lo à Itália e concedeu asilo político no último dia de seu segundo mandato.
A decisão gerou forte crise diplomática entre os dois países e só foi revertida anos depois. Em 2018, sob o governo de Michel Temer, o asilo foi revogado e o STF determinou sua extradição. Battisti, porém, fugiu do Brasil, foi capturado na Bolívia em janeiro de 2019.
A situação mostra que, embora os tratados entre países prevejam a extradição, fatores políticos podem ser determinantes. No caso de Battisti, o Brasil decidiu não cumprir uma decisão judicial própria — algo que agora pode ocorrer no sentido inverso, com a Itália diante de um pedido oficial do Brasil.
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Cidadania italiana como escudo
Zambelli deixou o Brasil pela fronteira com a Argentina e viajou até a Europa dias após sua condenação. Ela foi sentenciada a 10 anos e 8 meses de prisão por envolvimento na inserção de mandados de prisão falsos no sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com a ajuda do hacker Walter Delgatti Neto.
No momento, Zambelli está sob custódia da polícia italiana, e a Justiça do país tem até 48 horas para decidir se ela será solta, colocada em prisão domiciliar ou mantida presa. O Brasil já formalizou o pedido de extradição, que foi encaminhado ao Ministério das Relações Exteriores italiano e será avaliado judicialmente.
Embora o tratado de extradição entre Brasil e Itália — assinado em 1989 — permita a cooperação entre os países, ele também estabelece cláusulas que possibilitam a recusa, como a nacionalidade do réu. A Constituição italiana, no entanto, não proíbe a extradição de seus cidadãos — ao contrário da brasileira, que veda expressamente esse tipo de medida.
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Lewandowski: “Esperamos reciprocidade”
O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, afirmou que não há impedimento legal para a extradição de Zambelli, mesmo com sua cidadania italiana. Ele usou o caso Battisti como exemplo inverso. “O Brasil extraditou Cesare Battisti para a Itália. Esperamos que a Itália extradite essa senhora o mais breve possível”, afirmou.
Segundo o ministro, “a dupla nacionalidade, tendo em conta o tratado, não impede a extradição, até porque a Constituição italiana não veda a entrega de seus próprios cidadãos, como acontece na brasileira”.
Clima político na Itália
A decisão final caberá à Justiça italiana, que avaliará se há fundamentos legais, diplomáticos ou humanitários que justifiquem a extradição de Zambelli. A pressão política dentro do país já começou: o deputado Angelo Bonelli, que denunciou o paradeiro da brasileira, cobrou publicamente o governo italiano por respostas rápidas e alertou que a Itália não pode se tornar “refúgio para golpistas”.
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Se extraditada, Zambelli cumprirá pena definitiva no Brasil — sem direito a novos recursos. Mas, caso a Itália negue o pedido, o episódio poderá tensionar as relações bilaterais e abrir precedente delicado sobre impunidade de políticos condenados no exterior.
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