O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta quarta-feira (10) pela absolvição de Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, em todas as acusações ligadas à trama golpista.
Em sua análise, Fux afastou a responsabilização de Torres pelos crimes de organização criminosa e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Para o ministro, não há provas de que o ex-ministro tenha determinado ou planejado ações para abolir o regime democrático.
Reuniões não configuram crime
A Procuradoria-Geral da República (PGR) acusava Torres de participar de reuniões com militares e apresentar fundamentos jurídicos para viabilizar decretos golpistas. Fux, no entanto, afirmou que não foi identificado nenhum documento, imagem ou vídeo que comprove ordens nesse sentido.
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“As reuniões tiveram caráter institucional, ligado às funções de sua pasta, e não houve ajuste com outras pessoas para execução de um golpe de Estado”, destacou o ministro.
Live e falas públicas
Fux também rejeitou a acusação de que falas de Torres em eventos institucionais e em uma live de 2021 configurariam atos executórios de golpe. Para ele, discursos críticos ao processo eleitoral não equivalem a ataques concretos à democracia.
“Podemos discordar do conteúdo, mas não se pode criminalizar quem defende, por exemplo, o voto impresso. Isso não é o início da execução de um crime de atentado ao Estado Democrático de Direito”, afirmou.
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Uso da PRF nas eleições
Outro ponto da denúncia era o suposto uso da Polícia Rodoviária Federal (PRF) para dificultar a chegada de eleitores de Luiz Inácio Lula da Silva às urnas no segundo turno de 2022.
Para Fux, a acusação não apresentou provas da participação de Torres.
“O Ministério Público pretende uma imputação penal objetiva, atribuindo responsabilidade por fatos praticados por terceiros, sem demonstrar sua contribuição dolosa”, disse o ministro.
Absolvição por dano e patrimônio
Assim como em outros casos, Fux absolveu Torres das acusações de dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado relacionadas aos atos de 8 de Janeiro. Para ele, não há provas de que o ex-ministro tenha participado ou se omitido diante das depredações na Praça dos Três Poderes.
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Princípio da absorção
Fux ainda aplicou o princípio da absorção, pelo qual o crime de golpe de Estado seria englobado pelo de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, afastando a análise em separado.
Com esse posicionamento, o ministro abriu mais uma divergência em relação ao relator Alexandre de Moraes e ao ministro Flávio Dino, que votaram pela condenação dos oito réus do núcleo central da trama golpista.
O julgamento em andamento
A Primeira Turma do STF, presidida pelo ministro Cristiano Zanin, retomou na quarta-feira (10) a análise da denúncia contra o chamado “núcleo crucial” da suposta trama golpista, apontado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como responsável por articular medidas para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) após a eleição de 2022.
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Os ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino votaram pela rejeição de todas as preliminares arguidas pelas defesas e pediram a condenação dos réus por todos os crimes imputados pela PGR. O julgamento terá sessões extraordinárias até 12 de setembro.
Voto do ministro Alexandre de Moraes
Para o relator do processo, ficou comprovado que houve uma tentativa de golpe de Estado a partir de 2021, quando os primeiros atos preparatórios começaram a ser executados com o uso indevido de órgãos públicos, como a Abin e o GSI, para desacreditar as urnas eletrônicas e o Poder Judiciário.
Moraes tratou Bolsonaro como líder de uma organização criminosa hierarquizada, estruturada com divisão de tarefas e composta por militares e integrantes do governo federal. Segundo ele, o objetivo do grupo era garantir a permanência no poder “independentemente do resultado eleitoral”, utilizando instrumentos ilegais e atentando contra a democracia.
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O ministro rejeitou todas as preliminares apresentadas pelas defesas, mantendo a validade da delação premiada de Mauro Cid e das provas reunidas pela Polícia Federal. Ele ressaltou que não é necessário consumar o golpe para que o crime esteja configurado — os atos executórios já são suficientes para responsabilizar os envolvidos.
Para o ministro, as provas reunidas demonstram que o alvo central da conspiração foi o Estado Democrático de Direito, atacado de forma sistemática para minar as instituições e abrir caminho para a perpetuação do grupo político de Bolsonaro no poder.
Voto do ministro Flávio Dino
O ministro Flávio Dino acompanhou o relator Alexandre de Moraes e votou pela condenação de Jair Bolsonaro e outros sete réus da chamada trama golpista.
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Em sua fala, Dino rejeitou a tese das defesas de que as condutas seriam apenas “atos preparatórios”. Para ele, houve atos executórios concretos que configuram violência e grave ameaça, como bloqueios de rodovias, tentativas de fechar aeroportos e ataques às instituições. O ministro destacou que crimes de empreendimento — como golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito — não exigem consumação para serem punidos.
O magistrado também foi categórico ao afirmar que os crimes imputados aos réus são insuscetíveis de anistia, por envolverem ações de grupos armados contra a ordem constitucional. Dino rechaçou ainda a ideia de uma “autoanistia” em favor de altos escalões de poder, lembrando que nunca houve precedente desse tipo na história do país.
Ao analisar a participação de cada réu, Dino adiantou que as penas não devem ser iguais, pois os níveis de culpabilidade variam. Bolsonaro e Walter Braga Netto foram apontados como líderes da organização criminosa, com maior responsabilidade. Garnier, Anderson Torres e Mauro Cid também foram classificados com alta culpabilidade, enquanto Augusto Heleno, Alexandre Ramagem e Paulo Sérgio Nogueira tiveram participação considerada de menor importância.
Próximos passos
O processo segue agora para os votos dos ministros Cármen Lúcia e Cristiano Zanin. Cada voto será dividido em duas etapas: primeiro, a análise das preliminares — como a validade da delação de Mauro Cid e a competência do STF; em seguida, o mérito, com a avaliação das provas apresentadas pela PGR.
A decisão final será tomada por maioria simples. Caso confirmada a condenação, a definição das penas será discutida em fase posterior.
Quem são os réus
Além de Bolsonaro, respondem na ação:
• Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor-geral da Abin;
• Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;
• Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do DF;
• Augusto Heleno, ex-ministro do GSI;
• Mauro Cid, tenente-coronel e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro;
• Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;
• Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e da Casa Civil, candidato a vice-presidente em 2022.
Os oito réus são acusados de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado por violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado. No caso de Ramagem, parte das acusações foi suspensa por decisão da Câmara dos Deputados.
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